terça-feira, 1 de julho de 2014

Raridades me dás a beber
No silêncio da noite
E tacteio por entre folhas imóveis
Que não volto a ler.

Antes murchassem as rosas no meu peito
E partiria, vagueando, na alvorada.
Se uma taça de vinho me saciasse,
Mergulharia na  ânfora licorosa

Vem solstício de verão
Aquece a dor
Suaviza o coração
Dá-me mimos, habita-me.

Tu, crueldade, que me destróis
A pele, rasgas-me a voz
Quando o peito me pede um doce canto
Que faço  à tortura?
Despeço-me das horas tristes

Não me deixarei vencer
pela soberba torre.
E tu, que me ofereceste a taça,
onde estás?

Isis,  depois de ler  Omar Kayam
Gramática sensorial

Soergueu-a.
Tocou-a.
 Chegou-se mais a ela.
 Sabia que só a teria 
se a possuísse até ao infinito, 
em todos os tons 
e pensou que se a despisse  
de velhos conceitos, 
ela voltaria aos ancestrais tempos, 
onde fora rainha 
na casa de Salomão.
Hoje, servil e abusada, 
tem de ser resgatada 
à  perfeita musicalidade.
 dos corpos.
Domá-la-ia a cada instante, 
passou-lhe os dedos pelo dorso, 
inventou-lhe paladares novos, 
para sobrevoar 
e novos recortes  encontrar.

. Amar-te é reviver-te por dentro. Sorris. Sabes seduzir-me. Afagas-me criativamente. Escrevo-te, re-escrevo-te, para me conhecer. Em ti sonho-me diferente
Na lonjura das palavras...


Escolho a mesa ao canto.
O sol, intenso, mirava-se no meu livro,
o teu Crisol.
Para te ler, roubo-te as palavras,
 invento-lhes novos sentidos.
Perdoa-me.
Uma ogiva desenhava-se na página iluminada,
 onde as tuas palavras se estendiam
como cristais em mapas de alabastro.
Descobrindo o teu texto,
vejo nascer o meu,
refeito nas pautas da tua lira.

 Cantando deslizam ,
 na folha franca do meu texto
as tuas melodias.

Quem são esses poetas que ousas nomear?
Os poetas malditos...
Que  trazem nos olhos as dores do mundo...
Viveram a loucura das seivas inflamadas
no vai-e-vem das marés,
Na partitura da onda espraiada.

Deposito  palavras à beira terra,
 na folha em branco
entre linhas que não escrevo.
Apenas penso.
Deponho as mais belas
que roubei aos poetas malditos
que exclamam quando atravesso
a Jerusalém do teu poema:
Eis-nos,  sílex que buscas.

E no outro lado da página,
Na "terra do poema",
há ruelas antigas registadas em diários
depositados no fundo de uma cómoda,
ansiosa por resgatar secretos martírios
 das almas abandonadas.

Que ânsia longe chora agora
o indizível que cravado no peito fica
quando no olhar me deixas
toda a ternura que te não posso dar.
Não esperes nunca nada.
 Já não há "mel na terra".
Saltam palavras de página em página
 desta "Safra" poética
que empilhei na mesa ao lado
 porque os mestres da palavra
 lançam vozes adamantinas
sobre  o meu sonho
para adestrar o que já não sou
e nunca serei.

Palavras, prefiro-vos violentas às golfadas,
não de fácil pensamento,
mas de vinhos acres, não deleitosos.

Lei-vos demais, ó poetas malditos!
Apenas sei que
permaneci no teu Crisol .
Retiro-lhe a gema, o magma 
e de Sírius descem estrelas.

 Ah, pudesse eu desvendar
o mistério maior da vida.
Quantas mortes, quantas  vidas...
 neste galope desenfreado
que habitamos!

Eu sou o vocábulo que te inscreve
na voz do verbo "silene" de constelações.
Venha o sol, venha a dança, em rios de fogo
Que a luz pulse planetária
 para que se inventem novos códigos.

Sacrifiquem-se inocentes palavras
às aras votivas do deus lar
e farei dessas palavras uma roda viva
de chama violeta
para que o mundo prossiga

em sua legítima defesa.

Isis  responde ao CRISOL de Ana Pinto