terça-feira, 30 de agosto de 2011

Ao poeta dos poetas

Não meu, não meu é quanto escrevo

Se cativa me tens na voz astral
deste peito que é teu sendo meu,
Ó, ave sem carne, forma imortal,
Retens as palavras que me alentam
à noite, onde germinam estrelas
do meu cativeiro, terra escura, mineral
Saio, num voo raso, mas logo me entrego,
qual cavaleiro andante,
à pátria interior que carrego.

De quem são as palavras que me habitam?

SAFRA

FUROR POÉTICO
Regresso aos verssos rasos que componho
Nesta sede abissal, não refreada,
Para que surja a maiêutica do sonho
Parindo mais um filho; a madrugada.
Cavalo de Tróia, onde a noite vem
Arrancar das arenas os recortes
Das sombras milenares, de cujas mortes
Ressuscito, ficando sempre aquém
Do verdadeiro travo da cicuta,
Do banho em que adormeço, onde desperto
No mundo das ideias sem ter luta
Que não seja para me encontrar... Que oferto
No místico desígneo (quase insano)
Sobre a planura estéril, o branco irmão,
Os grãos da minha safra, a alocução
Num turbilhão constante, todo o ano...
Desço a caverna.
-Quero-te, palavra!
Num ímpeto feroz, quase brutal,
Que esta ansiedade é de tal modo brva.
Olho para trás, e aqui estou eu, a morte...
Ó triste devaneio febril, diurno,
Colheita a meio do dia... Eis , Saturno
MANUEL NETO DOS SANTOS