FUROR POÉTICO
Regresso aos verssos rasos que componho
Nesta sede abissal, não refreada,
Para que surja a maiêutica do sonho
Parindo mais um filho; a madrugada.
Cavalo de Tróia, onde a noite vem
Arrancar das arenas os recortes
Das sombras milenares, de cujas mortes
Ressuscito, ficando sempre aquém
Do verdadeiro travo da cicuta,
Do banho em que adormeço, onde desperto
No mundo das ideias sem ter luta
Que não seja para me encontrar... Que oferto
No místico desígneo (quase insano)
Sobre a planura estéril, o branco irmão,
Os grãos da minha safra, a alocução
Num turbilhão constante, todo o ano...
Desço a caverna.
-Quero-te, palavra!
Num ímpeto feroz, quase brutal,
Que esta ansiedade é de tal modo brva.
Olho para trás, e aqui estou eu, a morte...
Ó triste devaneio febril, diurno,
Colheita a meio do dia... Eis , Saturno
MANUEL NETO DOS SANTOS
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